sábado, 17 de setembro de 2011

Essas mulheres...

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Ritinha era um pitel de menina linda aos 13 anos. Aos 15 era uma mulher arrebatadora. Não demorou muito e logo os carinhas mais espertos da cidade pequena perceberam atributos mais indizíveis da moça. O português da padaria à esquina do açougue do seu Romão suspirava ao sentir o vento do seu vestido num passo largo pela calçada. Que bela rapariga!, dizia.

Quem arrastava um caminhão de areia por ela era o Damião. Não que outros iguais a ele não riscassem a asa também, porém Damião era capaz de dar a vida por ela. Dormia e acordava sonhando com aquelas curvas, em seus braços, mostrando-lhe o caminho para o prazer de viver. Damião fechava os olhos e era Ritinha que se desenhava em seus pensamentos. Umas vezes nua, outras, vestida de princesa. Sempre aos olhos da imaginação do rapaz qualquer roupa a tornava uma miss. Miss Mundo de Damião.

Mas Ritinha não dava bola. Eu jamais namoraria com um rapaz do bairro, era o que garantia a bela Rita em reposta às provocações de seus familiares. Moça de vinte não casa, alertava a Tia Esmeralda. Ritinha ouvia isso desconfiando por trás daqueles olhos de amêndoas. Parecia uma indiana. Embora de fato os anos corressem a galope, ela depositava integral confiança em sua beleza. Sentia que aquele pele esticadinha jamais haveria de ficar enrugada.

Damião era crente. Rita logo se interessou pelos bailes, bares e bebedeiras. Damião achava que isso era coisa do capeta. Como podia uma moça de família gostar dessas coisas! Indagava a si mesmo. os anos se foram e, depois de muitos namorados, festas e noitadas, Rita parecia desbotar qual rosa que avança além da estação. Damião, muito trabalhador, tinha conseguido juntar algum dinheiro. Já era dono de um comércio local, muito bem sucedido.

Em certa ocasião festiva Damião sentiu que era tempo de se declarar ao amor de sua vida. Um amigo o alertou de que talvez ele viesse a estranhar, assim por dizer, o fato de ela ser uma moça já experimentada, e bem experimentada por sinal. Damião disse que jamais isso seria um fardo. Disse que nunca pensou mesmo em casar-se com uma moça pura. Tinha até rejeitado algumas propostas de namoro de moças da igreja. Ele só tinha olhos pra Ritinha, e fim.

Noite afora, fim do baile, cruzou com ela na esquina da paixão e se declarou diante da escadaria da matriz. Ela o aceitou como namorado e ambos amanheceram de mãos dadas e com um compromisso: casarem-se. Ela questionou se não seria melhor darem um tempo antes de selar um matrimônio, mas ele disse que seu amor por ela já estava amadurecido a bastante tempo. Certa do amor que a cercaria, bem diferente do interesse meramente sexual que os outros rapazes demonstravam-lhe, e que ela bem aproveitava, ela convenceu-se e apostou no mesmo jogo que Damião, seu noivo. Correu a ventos largos as notícias sobre o casório. Estavam de fato ansiosos pela celebração. A moça não era crente, mas já acreditava em milagres.

Na noite de núpcias, como Damião se guardara até então, virgem como o solo marciano, teve certo embaraço em fazer aquelas coisas todas que se faz. Sabe, desabotoar a interminável fileira de botões do vestido de Ritinha. Embora embaraçado, o momento tinha lá seus encanto peculiares. Ela o ajudou a colocar o que tinha de ser colocado, guardar o que se tinha de ser guardado, em fim, Damião suspirou extasiado de prazer nos braços da morena antes do romper da madrugada. Olhando em seus olhos, ele não acreditava que aquilo fosse verdade.

Mas uma vez satisfeitos os desejos, o casal passou a conversar sobre diversas coisa. Falaram do futuro que almejariam uma ao lado do outro dali por diante, do passado...E foi ai que Damião descobriu o infortúnio jamais idealizado. Não acreditava, estivera até então certo de que as informações sobre as aventuras da moça jamais o perturbaria, mas uma vez ouvindo-a contar certos detalhes, sentia tudo isso de uma forma muito inusitada, triste e definitivamente incômoda.

O dia amanheceu, a semana passou, meses...até que ele resolveu romper com um assunto que não saia de sua cabeça, sendo o motivo do novo olhar deprimido que apresentava ultimamente. Ciúmes de passado da moça. Depois daquela mesma noite, inesquecível por muitos motivos, ela não conseguira descansar. Pensava nas emoções vividas por ela em momentos quentes com outros rapazes. Momentos tão quentes e marcantes quanto fora para o próprio Damião aquela primeira noite. Uma canção dizia que "a primeira vez não se esquece" o perturbava muito. Ele sentia o passado da moça como um monstro bem presente.

Confessando para Ritinha toda a dor que o afligia, Damião fizera juras de morte ao primeiro rapaz que a "colocou no mundo", que "a pôs na vida", que "a fez mulher". Todos estes termos populares tinham um sentido vivo e expressivo para Damião mas que para qualquer pessoa no mundo. Os pensamentos foram se juntando e perturbando muito, até que ouviu-se da casa vizinha a voz da moça pela última vez, num grito de horror enquanto uma faca a golpeava. Damião matara a esposa.

O espaço sagrado e restrito do lar serviu bem  ao episódio macabro que se desenrolou, sem chance de defesa, sem possibilidades de intervenção de quem quer que fosse, já que "entre assunto de homem e mulher ninguém mete a colher". Entre a sala e a cozinha foi morta a pobre Rita. Seu sangue escorreu pelo piso bem cuidado e limpo, com cheiro de pinho sol. Ela era uma dona de casa exemplar, embora seu passado fosse sujo demais para mente machista de Damião.

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